O continente americano e o Brasil estão envelhecendo mais rĂĄpido do que a média mundial, e a ampliação do acesso dos idosos à vacinação é um dos instrumentos para a garantia de uma velhice saudĂĄvel e autônoma, alertam especialistas que discutiram os calendĂĄrios de rotina de vacinação da terceira idade na Jornada Nacional de Imunizações. Além de hĂĄbitos saudĂĄveis, estar vacinado evita que infecções causem estresse no organismo e desencadeiem problemas que podem até mesmo se tornar crônicos.
O Programa Nacional de Imunizações (PNI), que completou 50 anos neste mĂȘs, oferece um calendĂĄrio especĂfico para essa população. Além das vacinas contra hepatite B e difteria e tétano, que são recomendadas desde a infância e podem ser administradas também nas faixas etĂĄrias superiores, idosos acamados ou em abrigos também devem receber a vacina pneumocócica 23-valente.Pessoas acima de 60 anos também precisam ser avaliadas caso precisem receber vacinas como a trĂplice viral e a febre amarela, que tĂȘm a tecnologia de vĂrus vivo atenuado. Além disso, as campanhas anuais contra a influenza e a vacinação contra a covid-19 são consideradas prioritĂĄrias para essa população.
Do ponto de vista individual, o idoso pode ter recomendações adicionais de vacinação, no caso de condições especĂficas de saĂșde, o que inclui doenças crônicas frequentes como o diabetes. Nesse caso, deve-se procurar um médico que encaminhe o paciente para os Centros de ReferĂȘncia em Imunobiológicos Especiais (CRIE).
Assessora de imunizações da Organização Pan-Americana de SaĂșde (OPAS), Lely Guzman, destaca que a vacinação dos idosos estava entre as preocupações da organização ao instituir a Década do Envelhecimento SaudĂĄvel entre 2021 e 2030. No fim desse perĂodo, uma em cada seis pessoas no continente americano terĂĄ mais de 60 anos.
"HĂĄ uma baixa prioridade do envelhecimento nas polĂticas pĂșblicas", aponta Lely.
"Os calendĂĄrios de vacinação ainda são muito pequenos perto de todo o desafio e das vacinas que podem ser Ășteis para os idosos".
A geriatra Maisa Kairalla, professora da Universidade Federal de São Paulo, destaca que as infecções respiratórias, como a influenza, o vĂrus sincicial respiratório e a covid-19 estão entre as maiores ameaças que podem ser prevenidas por vacinas.
"É muito difĂcil um idoso ter uma doença que o leve a ficar 15 dias na UTI e sair do hospital como chegou. É preciso muito cuidado, e, com isso, hĂĄ perda da qualidade de vida, da autonomia e maior chance de reinternação".
Mesmo sendo previsĂvel por vacina no Brasil desde a década de 1990, o vĂrus Influenza faz 70% de suas vĂtimas entre a população idosa. Além de internação e morte, essa doença também pode descompensar doenças crônicas como cardiopatias e diabetes e causar acidentes vasculares. O risco de morte por gripe chega a ser 20 vezes maior entre pessoas que acumulam cardiopatias e doenças pulmonares, condições frequentes entre idosos que foram ou são fumantes.
JĂĄ o vĂrus sincicial respiratório, apesar de estar entre as maiores causas de internação por sĂndrome respiratórias em bebĂȘs, faz a maior parte das vĂtimas fatais entre os idosos. As primeiras vacinas e anticorpos monoclonais contra esse vĂrus só começaram recentemente a ser adotadas nos Estados Unidos, e, no Brasil, a AgĂȘncia Nacional de Vigilância SanitĂĄria (Anvisa) analisa o pedido de registro da farmacĂȘutica Pfizer.
Presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, Marco Aurélio SĂĄfadi conta que jĂĄ era conhecida a importância desse vĂrus para a saĂșde da criança, mas avança cada vez mais a constatação de que ele é perigoso para os idosos.
"É algo novo. A gente jĂĄ conhece muito bem a carga da doença em crianças, mas a gente não conhecia tão bem assim a importância desse agente para os adultos. E hoje os adultos mostram que ele é um agente que pode impactar na população de adultos e principalmente nos indivĂduos de maior idade, principalmente acima dos 70 anos".
Outra doença que pode comprometer gravemente a qualidade de vida de idosos é o herpes zoster, uma manifestação do mesmo vĂrus da catapora, o varicela, que fica alojado no corpo ao longo da vida e volta a causar sintomas após a velhice, porém com um quadro diferente da catapora. A incidĂȘncia dessa doença chega a ser de 50% entre os idosos que chegam aos 85 anos de idade, segundo o Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC).
A vacinação contra a herpes zoster no Brasil só estĂĄ disponĂvel em clĂnicas privadas, em versões inativada e atenuada, e a Sociedade Brasileira de Imunizações recomenda a vacina para pessoas com mais de 50 anos ou imunocomprometidos com ao menos 18 anos.
Além de dores severas, a doença pode causar cegueira, paralisia facial e dores crônicas, que podem se estender por anos. Quanto mais idoso for o paciente acometido, maior é a chance de esse quadro crônico permanecer.
A SBIm recomenda ainda que todos os idosos busquem a vacinação contra os pneumococos, por meio das vacinas pneumocócica valente 13 e 15, também disponĂveis apenas nas clĂnicas particulares.
Apesar do nome, essas bactérias não provocam apenas casos de pneumonia, e estão associadas a infecções inclusive nas meninges, além de quadros de sepse.
A inclusão de vacinas que estão somente nas clĂnicas privadas no Programa Nacional de Imunizações depende de uma série de fatores, como o custo-benefĂcio para a saĂșde pĂșblica e a garantia de que estarão disponĂveis de forma contĂnua ao longo dos anos. Além de recursos para comprar, é preciso ter a certeza de que os fabricantes vão ter a oferta.
O diretor do Programa Nacional de Imunizações, Eder Gatti, explica que o cenĂĄrio ideal é, a partir de uma avaliação da epidemiologia de cada doença e da viabilidade dos preços oferecidos pelo mercado, construir uma agenda de incorporação dessas tecnologias para a produção nos laboratórios pĂșblicos.
"Estamos em uma fase de vacinas que agregam muita tecnologia e acabam tendo um custo muito alto. Consequentemente, temos um impacto orçamentĂĄrio muito alto para poucas doses. Então, o processo de incorporação tecnológica precisa ser muito bem pensado. Não dĂĄ para fazer na base da correria".
* O repórter viajou para Florianópolis a convite da Sociedade Brasileira de Imunizações.
Fonte: AgĂȘncia Brasil