Após uma falsa notícia de que teria assassinado cachorros ser divulgada, Rafael dos Santos Silva, de 22 anos, foi agredido com pauladas, pedradas e foi atropelado. Especialistas alertam sobre os riscos da disseminação das fake news. Polícia prende sétimo suspeito de homicídio por fake news em Suzano
Rafael dos Santos Silva, de 22 anos, foi espancado até a morte em Suzano, na Grande SP, após correr pelo bairro onde ele morava a falsa notícia de que ele matava cães. O caso revela como as fake news podem ser destrutivas e reacende o alerta sobre a necessidade de verificação das mensagens.
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No dia da morte de Rafael, o vereador Marcel da ONG postou um vídeo nas redes sociais e, sem falar o nome do jovem, afirmou que a pessoa a quem os moradores atribuíam as mortes dos animais tinha vários vídeos em rede social dizendo que cachorro é "coisa do demônio". Segundo a polícia, a partir disso, as falsas alegações de que ele havia matado os animais aumentaram na cidade.
Agora, o vereador é investigado por suspeita de propagação de notícia falsa e incitação ao crime, segundo o delegado responsável pelo caso, Rubens José Ângelo, do Setor de Homicídios e Proteção a Pessoa (SHPP) de Mogi das Cruzes.
As investigações do SHPP revelaram que o rapaz foi agredido com pauladas e pedradas e também foi atropelado. O delegado ressaltou que nunca encontrou os cachorros que supostamente foram mortos e que a investigação não comprovou que Rafael matou cães.
O g1 conversou com especialistas que orientam sobre os cuidados que todos devem ter antes de compartilhar mensagens. (Leia mais abaixo)
Rafael dos Santos Silva, de 22 anos.
Arquivo Pessoal
A importância da checagem
O professor de Gestão de Políticas Públicas na USP, Pablo Ortellado, ressalta a importância da verificação e de procurar por notícias confiáveis antes de compartilhar.
"Casos como este despertam a indignação, que é o sentimento que mais move compartilhamentos na internet. A recomendação que damos é para verificar antes de compartilhar, mas é muito difícil, porque as pessoas já estão indignadas. Elas não verificam e replicam esses boatos que resultam em uma tragédia."
Para Ortellado, o fato de o vereador participar de uma ONG de defesa dos animais pode ter acelerado a multiplicação da notícia falsa, já que ele faz publicações para um público que já tem grande sensibilidade com o tema. Com isso, não há uma reflexão antes do compartilhamento.
"Ele está se comunicando com um público que já tem grande sensibilidade com esse tema. Quando se traz o fato indignante, os seguidores que já apoiam a causa dos animais não param para refletir, para conferir, por exemplo, se algum jornalista verificou aquela informação", completa o especialista.
Poder da influência
Especialista em Direito Criminal, o advogado Jonathas Palmeira reforça que a criação ou disseminação de notícias falsas pode resultar em crimes, ainda que a conduta seja apenas a de compartilhar o conteúdo.
Vereador é investigado em caso de morte de rapaz por fake news
Reprodução/ Redes Sociais
"Informações falsas podem violar a honra, incitar a prática de crimes, dar causa à instauração indevida de investigação criminal ou administrativa e, a depender do caso concreto, em situações mais extremas, induzir ou instigar o suicídio", alerta.
O advogado lembra ainda que o alcance da publicação feita por uma pessoa pública, com grande número de seguidores, é muito maior e, certamente, será considerado quando se fala nas consequências do crime.
Então, considerando que a liberdade de expressão não é um direito absoluto, ele orienta que, antes de compartilhar qualquer conteúdo recebido por meio das redes sociais, sejam adotados os seguintes cuidados:
Evitar o compartilhamento de mensagens ofensivas;
pesquisar antes sobre as informações em sites jornalísticos, dando preferência para as notícias que estão nesses portais;
conferir o contexto e a data;
ter atenção redobrada para mensagens compartilhadas em grupos, principalmente originárias de listas de transmissão e aquelas identificadas como "encaminhadas com frequência";
desconfiar sempre de contatos ou perfis desconhecidos.
Veja o que se sabe sobre o caso e o que falta esclarecer no caso de Rafael
O que aconteceu?
Como a fake news foi espalhada?
O que diz a Polícia?
Como foram efetuadas as prisões?
Como foram as agressões?
O que diz a mãe de Rafael?
O que diz a defesa de Rafael?
O que diz a defesa do vereador?
A história de Rafael
1. O que aconteceu?
A agressão contra Rafael aconteceu no dia 17 de dezembro do ano passado, na Estrada do Tanaka, no bairro Estância Americana. Uma falsa notícia de que ele teria matado dois cachorros a facadas foi espalhada pelo bairro e também na internet. Ele, então, foi espancado até a morte por sete homens.
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2. Como a fake news foi espalhada?
No dia da morte de Rafael, o vereador Marcel da ONG postou um vídeo nas redes sociais e, sem falar o nome do jovem, afirmou que a pessoa a quem os moradores atribuíam as mortes dos animais tinha vários vídeos em rede social dizendo que cachorro é "coisa do demônio".
O jovem, segundo a Polícia, chegou a publicar vídeos na internet, falando que cachorros eram seres impuros. Foi a partir disso que as falsas alegações de que ele havia matado cães esfaqueados surgiram na cidade.
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3. O que diz a Polícia?
O delegado responsável pelo caso, Rubens José Ângelo, informou ao g1 que o vereador, conhecido como Marcel da ONG, é investigado por suspeita de propagação de notícia falsa e incitação ao crime.
Além disso, quando prendeu os suspeitos pelo espancamento, o delegado reforçou que nunca encontrou os cachorros que supostamente foram mortos e que a investigação não comprovou que Rafael matou cães.
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4. Como foram efetuadas as prisões?
No dia 30 de janeiro, o Setor de Homicídios e Proteção a Pessoa (SHPP) de Mogi das Cruzes prendeu seis suspeitos e, com eles, quatro celulares. O sétimo suspeito foi preso no dia 6 de fevereiro. Ele estava foragido e foi localizado pelos policiais do SHPP na cidade de Rio Grande da Serra, também na Grande São Paulo.
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5. Como foram as agressões?
Os suspeitos agrediram a vítima com pauladas e pedradas no corpo, cabeça e rosto. Além disso, Rafael também foi atropelado. Segundo a polícia, a vítima sofreu um traumatismo cranioencefálico.
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6. O que diz a mãe de Rafael?
Ariceli Santos diz que sabia que o filho tinha se envolvido com drogas ao se mudar para Suzano e, além disso, estava demonstrando um provável início de problemas psiquiátricos. Apesar disso, ela diz que tem certeza que o filho não mataria os cachorros.
"Rafael era meu filho, era meu amigo e meu companheiro. A gente conversava sobre tudo, eu me acabava de rir com ele e ele dizia sempre que me amava", disse a mãe em entrevista ao g1.
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7. O que diz a defesa de Rafael?
A advogada da mãe de Rafael, Nayara Raíssa informa que todas as medidas necessárias serão tomadas, buscando que todos os responsáveis diretos ou indiretos pela morte do jovem sejam devidamente julgados e processados na forma da lei.
A defesa informa também que foi já foi protocolada uma apuração de quebra de decoro parlamentar na Câmara de Suzano, conforme a Resolução n°013-99/00, para averiguação sob a conduta do vereador que também propagou a fake news que resultou na morte da vítima.
Outro ponto reforçado pela defesa é que o vereador Marcel da ONG nunca entrou em contato com a família ou a advogada para prestar esclarecimentos ou solidariedade.
"Neste momento de dor, solidarizamos com a família e amigos, e buscaremos incessantemente para que a justiça seja feita!".
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8. O que diz a defesa do vereador?
Por nota, a advogada do vereador, Graziella Salti Santana Bonini, informou que ele prestou esclarecimento no SHPP em 16 de fevereiro e ''que forneceu todas as informações relevantes para a investigação do caso".
Marcel da ONG é investigado por suspeita de propagação de notícia falsa e incitação ao crime
Ricardo Bittner/Câmara de Suzano
A defesa destaca que Marcel da ONG permanece à disposição para contribuir para a elucidação dos fatos e "que não há qualquer vínculo, de qualquer natureza, com o falecimento de Rafael."
"O Vereador Marcel da ONG, por meio de sua assessoria jurídica, lamenta profundamente o ocorrido com Rafael dos Santos Silva, e expõe sua total indignação e repúdio ao ato de crueldade contra ele praticado. Sobretudo, se solidariza com seus familiares e amigos", diz a nota.
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9. A história de Rafael
Nascido no Recife, capital do Pernambuco, Rafael se mudou para Suzano aos 19 anos, quando começou a trabalhar para a família de Dóris Simãozinho. No emprego, que permaneceu até os últimos dias de vida, foi de ajudante de pedreiro para pedreiro.
"Ele tinha apenas 22 anos, mas trabalhava muito, era muito esforçado e talentoso. Nunca tivemos problemas com ele, tínhamos um bom relacionamento. Meu marido pagou a passagem para ele vir para Suzano, ele morava com a gente", contou Dóris.
Cerca de um mês antes de Rafael morrer, ela conta que ele realmente estava com uns "papos estranhos", o que parecia ser um início de problemas psicológicos.
"Mas, ainda assim, eu não acredito que ele tenha matado cachorro. Inclusive, nunca me mostraram nenhum cachorro morto. Eu tenho quatro cachorros aqui, tenho gatos, cavalos e outros animais. Ele nunca os maltratou, fez até casinhas para eles", disse.
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