Mahmoud Al Madani, de 33 anos, veio com a família para o Brasil quando soube que o país recebia os refugiados da Síria, onde ele morou durante o início da guerra. Mahmoud Al Madani chegou ao Brasil em 2015
Mahmoud Al Madani/Arquivo Pessoal
Refugiado no Brasil desde 2015, Mahmoud Al Madani, de 33 anos, já presenciou muitas cenas que preferia esquecer. Mas, desde que chegou em solo brasileiro - mais especificamente em Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo -, ele encontrou acolhimento e pôde se sentir aliviado.
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Inicialmente, mesmo sem falar o português, encontrou "conhecidos de conhecidos" que o ajudaram a se estabelecer na cidade. Agora, ele trabalha em um hospital, onde é intérprete e de árabe/português e assistente administrativo, além de empreender no ramo de temperos.
Nascido na Arábia Saudita e descendente de palestino, ele foi muito novo morar na Síria como refugiado. Mas, pouco depois em que a guerra civil teve início no país, ele fugiu com a família para o Líbano, em 2012. Antes da fuga, ele viveu dias de muita crueldade e sofrimento.
"Começou a guerra e os terroristas invadiram a minha casa na Síria. Eles queriam obrigar eu e meu pai a virar terroristas também. Mas a gente conseguiu fugir e teve que andar quase 3 quilômetros a pé e, enquanto isso começou, a ter tiroteio e bombardeio. Ficamos desesperados, mas a gente andou, passou uma barreira e pegou um táxi direto para o Líbano. Era uma escolha, sair ou morrer", relembra Mahmoud.
Mas, antes de conseguir fugir, a família buscava sobreviver. As bombas caíam nos arredores de onde eles moravam e as mortes eram vistas diariamente.
"Nós vimos tudo o que aconteceu no começo da guerra, a gente viu as pessoas morrendo na rua. Os corpos ficavam jogados na rua e a gente não conseguia tirar, porque corríamos o risco de alguém atirar na gente. Então, a gente ficava nas esquinas das ruas jogando areia nos corpos para não subir tanto o cheiro e evitar doenças", conta.
A vinda para o Brasil
Após a fuga da Síria, Mahmoud ficou por três anos morando no Líbano. Em 2015, descobriu que o Brasil tinha um acordo para ceder o visto humanitário para os refugiados. Ele, então, veio para o país na companhia da mãe, Lameaa, e a irmã Zaynab.
Mahmoud veio para o Brasil acompanhado pela mãe, Lameaa
Mahmoud Al Madani/Arquivo Pessoal
"Quando ficamos sabendo que o Brasil estava nos respeitando como seres humanos, pegamos o visto e viemos. Nós tínhamos conhecidos que nos auxiliaram e falaram que Mogi das Cruzes tinha uma comunidade árabe grande e era uma cidade segura. Chegando aqui, eu logo comecei a trabalhar em uma loja de móveis de um árabe", diz.
Mahmoud ficou no emprego até 2017, quando a loja fechou. Então, para ter uma renda, comprou um carro e foi trabalhar como motorista de aplicativo. Ele lembra que precisava trabalhar muito para conseguir pagar as contas e as prestações do carro e, por isso, recebia também o apoio da comunidade árabe.
Após nove meses dirigindo pelas ruas da região, foi contratado para trabalhar como porteiro no hospital que atua até hoje. Ele conseguiu subir de cargo, trabalhou no patrimônio da unidade de saúde, e se tornou assistente administrativo no centro cirúrgico e intérprete, funções que ainda exerce, além de ser também secretário do proprietário do hospital.
"Os brasileiros tratam os estrangeiros muito bem e eu senti isso desde que cheguei aqui. No hospital, eu fui muito acolhido e as pessoas me ajudaram até mesmo com o português, que eu não sabia falar. Claro que quando cheguei levei um primeiro susto, mas depois veio o alívio, porque morar no Líbano estava difícil pelo preconceito que eles têm com quem tem cidadania palestina ou síria", ressalta Mahmoud.
Diferentes culturas
Quando se lembra dos anos em que viveu entre a Arábia Saudita, a Síria e o Líbano, Mahmoud se lembra com saudade dos irmãos e dos primos. Filho caçula de uma família com outros quatro irmãos, eles se separaram enquanto se refugiavam. Ele tem uma irmã e um irmão que moram na Suécia, uma irmã na Alemanha, uma que ainda está na Síria e a que mora com ele no Brasil, enquanto o pai mora na Holanda.
E por mais que o Brasil tenha uma cultura muito diferente da árabe, ele diz que nunca foi muito apegado a isso, já que sempre se adaptou a todos os lugares que morava. O que tem uma presença muito forte na vida de Mahmoud é a culinária árabe.
"Eu não sinto falta da comida, porque a nossa comunidade é tão grande aqui que a gente encontra tudo no Brasil. E eu moro com a minha mãe, que faz tudo o que a gente comia lá", ressalta.
O dom de Lameaa para a culinária, inclusive, se transformou em negócio. Hoje, o nome dela dá nome a uma marca de temperos sem sódio e sem conservantes.
"Foi a pessoa mais importante da minha vida que me deu essa ideia. Como eu não tinha um espaço para abrir um restaurante ou um lugar para vender comida, veio essa ideia dos temperos. A gente faz de uma maneira bem saudável e trazendo o tempero árabe para o Brasil".
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