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Vereadores de Mogi cobram nomeação de Comissão Especial na Câmara para apurar casos de assédio na prefeitura

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Por Nova TV Alto Tiete em 12/09/2023 às 17:34:20

Após mais de seis meses da criação, CEV ainda não foi nomeada. Servidores municipais relatam casos de assédio, além de irregularidades em afastamentos e trocas de cargos por parte da prefeitura. Defesa do prefeito Caio Cunha (PODE) afirma que rotações de cargos comissionados é movimento natural em trocas de governo. Comissão Especial de Vereadores aprovada em Mogi aguarda nomeação para iniciar trabalhos

Uma Comissão Especial de Vereadores (CEV), aprovada pela Câmara de Mogi das Cruzes em março deste ano, aguarda nomeação para começar os trabalhos. Entre os objetivos está a discussão e a cobrança por melhorias nas condições de trabalho dos servidores municipais. Os autores do projeto também querem apurar denúncias de assédio na administração municipal.

Rodrigo Saverino Bus é servidor público de Mogi das Cruzes. Por mais de dez anos, segundo ele, sempre trabalhou dentro da Secretaria de Educação de Mogi. Rodrigo conta que nunca pensou em sair da função, até que em um dia chegou para trabalhar e foi surpreendido com uma decisão da administração.

"Isso aconteceu dia 11 de fevereiro de 2021. Eu fui abordado pelo secretário de Segurança, mais uma pessoa na minha mesa, dizendo que eu tinha uma reunião de gabinete. Aí fui abordado pelo prefeito, ele me cumprimentou, a gente foi conversar ali no quarto andar, onde tem o lounge da prefeitura, da Secretaria de Educação. E a partir daí ele me perguntou sobre o sistema, eu falei pra ele que o sistema até que estava um pouquinho atrasado, mas que não tinha problema. Aí ele falou 'fica tranquilo, eu vou tirar o sistema de você. E você está sendo afastado por assédio'. Aí eu falei 'não estou entendendo'. Ele falou assim 'olha, aqui é alto, né?'. Eu falei 'é, mas, tipo assim, o que tem a ver?'. 'Então, estou te afastando. Sabe voar?'. Tipo assim 'não, prefeito. Não estou entendendo'. Aí ele falou 'você está afastado, pode ir pra casa'. Nessa situação, o que eu fiz? Não ia ficar discutindo com o prefeito. Peguei, desci pro meu andar. Quando eu voltei pra minha mesa, minha chefe, então, já estava me questionando o porquê o meu computador tinha sido retirado da minha mesa sem eu estar presente", disse Rodrigo.

Rodrigo Bus, servidor da Prefeitura de Mogi, denuncia o prefeito Caio Cunha (PODE) por assédio

TV Diário/Reprodução

O auxiliar de apoio administrativo afirma que nunca recebeu nenhuma notificação ou advertência que notificasse um afastamento. Por isso, ele resolveu procurar um advogado.

"Pedi as instruções pra saber como proceder, porque eu também não estava conseguindo processar tudo ao mesmo tempo, e aí, no dia seguinte, fui verificar na secretaria onde eu ia ficar. Afinal, afastado, como que fica meu ponto, como fica meu salário, como ficam as minhas atribuições. E eu fui deslocado pra Secretaria de Esportes e Lazer, lá na Praça da Juventude, lá no Jardim dos Amarais. Ficava sentado o dia inteiro, abrindo e fechando portão pra um lugar que estava fechado em época de pandemia. E aí, dentro do próprio processo foi comprovado que não aconteceu nada. A testemunha, a vítima, no caso, fala que nada aconteceu. Aí a comissão que julga os processos administrativos deu por encerrado, porque não aconteceu, de fato, nada", afirma Rodrigo.

Um advogado especialista em direito público explica que, para pedir o afastamento de um servidor público, é preciso seguir alguns pontos e ter fundamentos.

"A própria lei complementar que, no caso de Mogi, por exemplo, vai tratar dessa questão dessa remoção, que é a lei complementar 82, de 2011, traz situações muito específicas. Você só pode remover de ofício um funcionário público se você tiver uma justificativa de interesse público anterior ao ato de remoção. Então, não existe, como se pensa, uma liberdade ampla, irrestrita e geral que pra que os prefeitos e os secretários hajam como entendam que devem agir", disse Wagner Gundim, mestre em direito político e especialista em direito público.

Procurado pela produção do Diário TV, o advogado de Caio Cunha (PODE), prefeito de Mogi das Cruzes, diz que existe um processo administrativo contra Rodrigo, que corre em segredo de justiça.

"Foi instaurado um processo administrativo disciplinar sim, e foi prestigiado todo o contraditório e ampla defesa a esse servidor público. Se tem notícia de que esse procedimento ainda não se encerrou. Em relação a possíveis deslocamentos desse servidor, se trata de interesse público e discricionariedade da administração pública. E também estamos falando de um período no qual havia toda uma instabilidade diante da pandemia do Covid-19. O que se pode garantir é que os fatos em nada se relacionam com o procedimento administrativo disciplinar instaurado em face desse servidor público", disse o advogado Paulo Tadai.

Sobre a afirmação do funcionário público Rodrigo que em conversa com ele, o prefeito falou da altura do prédio e perguntou se Rodrigo sabia voar, Tadai informou que tal alegação não tem qualquer fundamento, já que nada foi apresentado pelo entrevistado em questão e reforçou que, quando o processo se tornar público, todas as informações poderão ser prestadas

Rodrigo conta ainda que passou por troca de cargos por quatro vezes durante a gestão do prefeito Caio Cunha. Em uma delas, ele mudou até de secretaria. No entanto, posteriormente, a Justiça determinou a recolocação ao cargo de origem.

"E aí a prefeitura, desde então, não cumpre essa liminar de junho de 2021. E aí eu fui realocado pra uma escola, mais no Centro da cidade. E aí, o que acontece? Desde então, eu sou considerado um servidor adido. Eu perdi minha sede, eu tenho que passar por remoção, eu tenho que… Simplesmente assim, se uma pessoa que estava no lugar na minha escola decidir voltar, eu tenho que ir pra qualquer lugar", contou Rodrigo.

De acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo, o remanejamento de cargo envolvendo Rodrigo foi feito de forma equivocada, já que ele deveria ter sido notificado antes.

O documento do TJ aponta alguns erros, como na aplicação de uma sanção - remoção - sem o devido processo legal. "(...) comunicaram o autor sobre um comportamento que teria manifestado em reunião, diante de sua nova superior (a qual não reconhece isso como motivo determinante), sem nem mesmo ouvir previamente o autor". Outro erro indicado no documento diz respeito à legalidade do ato. "(...) Com efeito, a remoção de ofício deve se dar por interesse público (e não para demonstrar a força do grupo que chegou) e dependerá de prévia justificativa da autoridade competente".

Em junho de 2021, ato administrativo de remoção de Rodrigo foi suspenso pela Justiça

TV Diário/Reprodução

Diante disso, o juiz Bruno Machado Miano, suspendeu o ato administrativo de remoção do autor e orientou a reintegração do funcionário para o cargo de origem, sob pena de multa diária de R$ 1 mil, com validade de 60 dias.

"Qual o problema? Quem vai pagar a conta disso? A prefeitura, ou seja, os munícipes. Porque não é o prefeito que vai responder, pelo menos num primeiro momento, de forma direta com o próprio patrimônio", explicou Gundim.

"A liminar foi cumprida em julho de 2021 referente a este processo. Entretanto, esse processo é grifado com a tarja de sigilo processual, o que inclusive me impede de ter acesso a demais informações e tornar público as informações desses autos. O que se pode garantir é que esse processo, aparentemente, ainda não foi sentenciado. E eu acredito que, após ele vir a tornar público, por meio de uma sentença, todas as informações poderão ser prestadas pela Procuradoria Geral do Município", afirma Tadai.

Assédio na Secretaria de Esportes e Lazer

Outro caso que também teve repercussão envolveu o servidor Sergio Passos. Ele é funcionário concursado da Secretaria de Esportes de Mogi há cerca de oito anos. Com a troca da última gestão, ele passou por vários remanejamentos de cargo e, com isso, o funcionário conta que chegou a desenvolver depressão.

"Eu fui chamado pra uma conversa com o secretário. Nessa conversa, que foi uma conversa privada, entre eu e ele, ele alegou que a minha permanência na secretaria não poderia continuar, devido ao fato de eu ter vínculos de amizade com a gestão anterior. E depois disso, eu fiz um desabafo nas redes sociais contando um pouco dessa história, de certa forma indignado. E como consequência dessa exposição, desse desabafo da rede social, eu fui removido outra vez. Entrei numa crise nervosa, acabei entrando no primeiro pico de depressão", explicou Sergio.

O servidor Sergio Passos passou por vários remanejamentos de cargo e chegou a desenvolver depressão

TV Diário/Reprodução

Para o especialista, a mudança de função com a troca de gestão é uma prática comum dentro de prefeituras.

"Algumas mudanças vão acontecer, isso é muito natural. Não existe nenhuma ilegalidade e irregularidade nisso, do novo prefeito alocar, pra cargos de confiança, pessoas que já trabalham no seu entorno. Não existe nenhuma ilegalidade nisso. O problema existe quando a ideia da discricionariedade passa a ser regra, que você percebe o cometimento de abusos. Vejam, a possibilidade de você remover um funcionário público pra um outro cargo, outra função, de você rebaixá-lo pra funções que ele exerce, elas são sempre limitadas", afirmou Gundim.

Depois de quase um ano afastado, Sergio conta que voltou a trabalhar, mas logo teve acesso a uma lista de funcionários dividida por cores, onde ele estava na lista vermelha que, segundo ele, era destinada a funcionários não confiáveis. Como ele divulgou a lista, Sergio conta que a prefeitura tentou remover ele de posto, encaminhando o funcionário para o centro esportivo de Biritiba Ussu.

O nome de Sergio Passos apareceu em lista vermelha da Secretaria de Esportes de Mogi

TV Diário/Reprodução

"Não existe qualquer tipo de lista vermelha. Os cargos comissionados, por si só, decorrem de uma confiança. É muito natural, a cada troca de governo, haver essas rotações de cargos comissionados. Veja bem, o chefe do Executivo está ali justamente pra executar os projetos no qual ele foi eleito pela maioria da população. E nada mais justo que ele buscar pessoas nas quais ele confia, justamente pra executar essas ações. Eu posso garantir que essas rotações em nada têm a ver com perseguição política, mas sim está pautada dentro do interesse público e discricionariedade da administração", disse Tadai.

No documento entregue a Sergio, a prefeitura justifica a transferência como sendo "devido ao quadro reduzido de professores e gestores disponíveis na secretaria." O comunicado ainda diz que o local precisava de supervisão de um profissional devidamente habilitado.

Mas a Justiça considerando que Sergio estava em tratamento psiquiátrico, bem como a ausência de portaria ou justificativa para remoção, atendeu o pedido do funcionário, para que ele fosse mantido em seu lugar de trabalho.

Comissão Especial de Vereadores

Casos como esses foram citados na sessão da Câmara de Mogi das Cruzes do dia 14 de março deste ano. Primeiro pelo vereador Francimário Vieira, o Farofa (PL).

"Um dia eu atendi, o vereador Maurino, uma servidora com o seu esposo que ela chorou. Ela chorou, disse 'vereador, eu não aguento mais. Sou concursada de carreira há 16 anos'", declarou o parlamentar.

Na mesma sessão, a vereadora Inês Paz (Psol) também falou sobre o assunto.

"Eles nos procuram para relatar o sofrimento, as angústias, como diz, os desafetos que são feitos por alguns funcionários, justamente porque tem aí a questão ideológica, porque vem de outra administração. E são funcionários de carreira, concursados", disse a vereadora.

Casos de assédio foram citados na sessão da Câmara de Mogi do dia 14 de março deste ano

TV Diário/Reprodução

Foi nessa sessão da Câmara que Inês Paz e Francimário apresentaram a proposta para a constituição de uma Comissão Especial de Vereadores (CEV). Entre as finalidades da criação da comissão estão a promoção de debates e diálogos com servidores públicos municipais (incluindo a autarquia) para discutir e cobrar melhorias nas condições de trabalho, plano de carreira, qualificação profissional. Entre os objetivos da CEV está também fiscalizar o respeito aos princípios da administração.

"A CEV tinha vários objetivos. Mas agora nós estamos focados nessa questão do assédio porque ela já está pública, não só na cidade de Mogi das Cruzes, mas foi divulgado amplamente. O nosso objetivo é fazer o relatório, depois, conforme for apurando e fiscalizando, a gente encaminhar para o Ministério Público do Trabalho e a gente também pedir medidas, ouvir representantes da prefeitura", explicou a vereadora.

No dia 22 de março, foi publicado o parecer da Comissão Permanente de Justiça e Redação sobre a proposta. "Com relação ao assunto a ser tratado verificamos que o mesmo é de interesse público, portanto, torna-se assunto primordial a participação dessa Casa Legislativa nas discussões referente ao tema apresentado. No dia 29 de março, a proposta de constituir uma CEV foi aprovada.

Após mais de seis meses, a Comissão Especial de Vereadores ainda não foi nomeada.

"Eu quero perguntar pro presidente da Câmara porquê ele não cria essa CEV. A gente fica perguntando, nós estamos todos os dias cobrando a presidência da Câmara, porque a responsabilidade da criação é da presidência da Câmara. Mas será que tem, por detrás disso, um envolvimento da prefeitura que não quer que essa CEV seja criada?", questionou a vereadora.

Ainda de acordo com o advogado do prefeito Caio Cunha, a abertura de uma CEV não é de competência do poder Executivo.

"No próprio dia 5 de setembro de 2023, o chefe do Governo, vereador Maurino, solicitou ao presidente da Câmara dos Vereadores esclarecimentos sobre possíveis e existentes denúncias desses casos. Na mesma data, houve uma resposta formal do secretário Geral da Câmara dos Vereadores informando a inexistência de qualquer registro de denúncia protocoladas na Casa Legislativa", disse Tadai.

Um documento da Câmara apresentado pelo advogado e assinado pelo secretário-geral do legislativo diz "nada constar referente a representações, denuncias e/ou documentação contra o senhor prefeito municipal de Mogi das Cruzes. E, ainda, nada constar referente a representação distribuída junto ao conselho de ética e decoro parlamentar da Câmara Municipal de Mogi das Cruzes, ou mesmo qualquer ação judicial movida por esta edilidade e que não teve e não está sofrendo processo de cassação".

Segundo Inês Paz, são várias as secretarias que estão com denúncias de assédio. Com a abertura da Comissão, ela acredita que mais casos devem aparecer.

"Secretaria de Educação, Secretaria de Esporte, Secretaria de Saúde, que envolve a Zoonoses, a Guarda Municipal, a gente tem denúncias afirmadas por funcionários dizendo que atrás deles têm outras pessoas, muito mais funcionários, que também sofrem assédio, que também são pressionados. Como a CEV ainda não está instalada, eu não posso afirmar quantos casos estão envolvidos. Mas o que a gente sabe é que são muitos casos", explicou a vereadora.

"Essas notícias estão sendo tratadas, até então, como falácias, totalmente distorcidas e de cunho eleitoral", disse o advogado do prefeito de Mogi.

"Eu estou afastado já há quase um ano. Tomo medicação, tomo remédio pra dormir, tomo remédio pra depressão, pra ansiedade. Faço terapia. Não é fácil, não é fácil pra ninguém enfrentar uma situação dessas. Mas estou lutando. Espero um dia voltar com a saúde recuperada. É muito doloroso", desabafou Sergio.

O que diz a Câmara sobre a CEV

Sobre a nomeação da Comissão Especial de Vereadores dos servidores municipais, a Câmara de Mogi respondeu que, nas indicações verbais para compor a comissão, ocorreram divergências partidárias e não foi respeitada a representação proporcional partidária. Além disso, a Câmara disse que, seguindo o regimento interno, caberá ao presidente da câmara indicar os vereadores que vão compor a comissão.

Na última sexta-feira (8), o presidente da Câmara, Marcos Furlan (PODE), disse à produção do Diário TV que solicitou aos líderes partidários que enviassem os nomes para a CEV, em dois úteis. A assessoria da Câmara informou que esse ofício foi entregue no dia 5 de setembro aos líderes partidários. Na manhã desta terça-feira (12), confirmou que os nomes já foram enviados, mas ainda não houve a nomeação da comissão.

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Fonte: G1

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