Moradores estão completamente ilhados, em meio à água suja, entulhos e partes de móveis. Caio Vano Cogonhesi, advogado especialista em direito imobiliário e ambiental, explica quais os direitos de quem moradores de lugares irregulares nas cidades. Com previsão de chuvas, moradores de Mogi das Cruzes se preocupam com possíveis enchentes
Com essa previsão de chuva, a preocupação de quem vive em áreas alagáveis é muito grande. Este é o caso dos moradores do Jardim Aeroporto II, em Mogi das Cruzes. Lá, parte do pessoal ocupou a área de forma irregular.
Toda vez que chove, Erotildes Lopes fica ilhado. Ele passou a manhã toda tirando a água suja que vem do rio poluído.
A água não invadiu o quarto por causa do batente. A geladeira tem que ficar suspensa. Toda vez que chove é assim. O idoso mora em uma área irregular no Jardim Aeroporto II. “Eu queria até que fosse regularizado, que a gente pudesse pagar água, pagar luz, pagar o imposto do terreno. Eu pretendia isso, mas até hoje não tem. Até já veio um pessoal da prefeitura aqui, mediu alguma coisa, marcou o lugar de poste de luz mas ficou nisso mesmo, rodou e ninguém cá”, disse o aposentado.
Moradores do Jardim Aeroporto e do Jardim Oropó estão completamente ilhados, em meio à água suja, entulhos e partes de móveis.
O bairro está alagado por causa da chuva forte dos últimos dias. Moradores da rua botsuana comentam que toda vez que o Rio Oropó transborda isso acontece. Essa é uma área que não é reconhecida pela Prefeitura. Jeferson Silva dos Santos vive aqui e se arrisca passando na água suja sem nenhuma proteção.
“Agora eu tô doente, tô com o peito doendo, né? Nariz escorrendo aí de gripe, né? Mas é assim mesmo que tem que ir, sobreviver. Vai morar aonde? Aqui é tudo invasão, a maioria. A maioria é invasão. Regularizado é só pra lá”, disse o jardineiro.
No local vivem muitas famílias. A reportagem do Diário TV tentou chegar na casa de Jorge Luis Rodrigues, mas não foi possível.
“Todo ano. É janeiro e fevereiro. Olha, começou agora a chuva. Olha, imagina até o meio do ano, o meio do mês, como é que vai ficar. Não tem como. A gente não paga imposto, né? Não paga imposto, não paga luz, não paga água. Eu tô desempregado por enquanto. A minha mulher ela ganha R$ 800 por mês. Nem R$ 1 mil, porque ela fez empréstimo aí, e tá descontando. Aí como é que faz?”, desabafa o auxiliar de pedreiro.
Morador tenta caminhar em trecho de via completamente alagada em Mogi das Cruzes
TV Diário/Reprodução
Se a situação está difícil pra quem mora em área irregular, quem paga imposto fica indignado. É o caso de Paulo Silva.
“A gente paga o IPTU, moro na outra rua atrás ali. Tem tubulação de esgoto, toda vez que chove, chove meia hora de chuva os esgotos transbordam, a rua fica cheia de esgoto, volta pra dentro das residências, tanto da minha quanto dos vizinhos. Então, esse esgoto retorna tudo no ralo do banheiro e as pessoas não sabem mais o que faz”.
O comerciante também afirmou que já entrou em contato com a Prefeitura em busca de soluções, porém passa por essa situação há um longo período. “Dizem que vão resolver, já há anos. Já tem cinco anos que eu moro aqui, oito que eu sou proprietário do terreno. E é sempre assim”.
E teve gente que desistiu de pagar o IPTU, como Sueli Pedroso. “Não adianta pagar sem estar uma coisa legalizada. Vou aguardar eles fazerem essa legalização pra gente receber o papel tudo certinho e finalizar o pagamento e continuar o dia”, disse a supervisora de vendas.
Em um vídeo gravado, Sueli mostra como fica a casa dela quando chove. “ Fica alagada, a casa toda cheia de água. E é uma água que vem do esgoto do rio que é o pior. Não é uma água que chove ali e junta água no meu quintal. Não, ela vem, retorna pelo encanamento. A pressão que faz o rio ele retorno pelo encanamento. Já perdi guarda-roupa, já perdi colchão. Minha geladeira queimou porque subiu água e pegou no motor. Perdi muita coisa”.
O prefeito de Mogi das Cruzes Caio cunha comenta que está ciente dos problemas e pede ajuda da Câmara para isentar do pagamento do IPTU as famílias vítimas de alagamento.
“Eu conto com o apoio da Câmara, que já, em 2019, aprovou um projeto aqui nessa casa pra isenção de IPTU dessas regiões que sofreram alagamento. Talvez não resolva o problema, obviamente, mas ameniza a dor das pessoas, já que perderam, alguns deles perderam parte dos seus
do seu mobiliário e até dos seus mantimentos”, disse o prefeito.
A Prefeitura de Mogi das Cruzes disse que está trabalhando para a melhoria da infraestrutura do Jardim Aeroporto e que concluiu ações de manutenção e limpeza em todas as valetas e córregos do bairro em dezembro de 2022. Informou que a Rua Botsuana sofre a influência do leito do Rio Jundiaí e que para este atendimento emergencial, trabalha junto ao governo do estado para o desassoreamento no trecho que passa pelos bairros da região oeste da cidade. Os recursos estão garantidos e a previsão é que os serviços sejam iniciados ainda neste primeiro semestre.
A administração municipal destaca, ainda, que na noite de quarta-feira (1º), moradores que tiveram as casas alagadas foram abrigados na Escola Municipal Professora Florisa Faustino Pinto e que, no momento, 15 pessoas, estão recebendo este atendimento. moradores cadastrados da região também receberam itens de primeira necessidade, como kits de limpeza, colchões, cobertores e cestas básicas.
Quanto à regularização do bairro, a Secretaria Municipal de Habitação esclarece que vem trabalhando em toda a cidade em estudos e procedimentos para regularização fundiária e que mais de mil títulos foram entregues a moradores de diversas regiões. A Prefeitura diz que o Jardim Aeroporto e o Jardim Santos Dumont têm características de ocupações antigas e que estão sendo feitos estudos voltados à regularização fundiária para os moradores.
Morador que disse estar doente caminha tenta se deslocar no bairro onde vive em meio à água
TV Diário/Reprodução
Regularização fundiária e IPTU
Os mogianos devem começar a receber os carnês do IPTU em casa já nos próximos dias. O advogado especialista em direito imobiliário e ambiental, Caio Vano Cogonhesi, explica que moradores que não pagam o tributo correm o risco de perder o imóvel.
“Infelizmente ele pode perder a casa. Vai sofrer uma ação que a gente chama de execução fiscal, é movida pela Procuradoria do município e essa ação pode culminar na penhora e leilão deste imóvel pra poder pagar as dívidas do imposto de IPTU. Então, não é recomendado que deixe de pagar o imposto territorial urbano, que é o IPTU”.
O advogado também analisa a situação de famílias que vivem em áreas que não foram regularizadas. “Ocupação irregular, a irregularidade não dá para sanar. Mas a Prefeitura tem instrumentos, por meio de lei, em que regularizar bairros pode ser por meio da Secretaria de Habitação, passa a regularizar o bairro entregando os títulos a essas pessoas, como dito na reportagem. Então, a prefeitura ela tem essa prerrogativa pra poder regularizar a situação dessas pessoas. Se elas estão ocupando lugar que ambientalmente não pode ocupar, áreas de preservação permanente, a prefeitura precisa remover essa pessoa destinando ela a uma localização que ela possa ocupar e tenha ali a sua vida noraml”.
Cogonhesi afirma que a isenção de IPTU a moradores de regiões que sofrem com alagamentos não é regra. “Não é um direito porque não tem previsão legal ainda no município. Em 2019, o município de Mogi das Cruzes editou uma lei só para aquele ano, ano de 2019. Vale ressaltar que a Prefeitura de São Paulo já tem uma lei desse tipo e, esse ano, 2023, ela foi promulgada em 2022, em 2023 já isentou os paulistanos que vivem em áreas de alagamento do IPTU. O ideal seria a solução do problema. Mas a isenção do IPTU seria um instrumento pra minimizar perdas, prejuízos dessa população mais carente que teve em sua residência. Então aí essas pessoas devem cobrar dos agentes políticos para que se faça uma lei isentando de IPTU, seja esse ano, ela pode ser retroativa, esse ano, se ela for promulgada esse ano, ou para o próximo ano em que a Secretaria de Habitação e a secretaria de Defesa Civil, elas mapeiam a área de inundação e já isentam essas pessoas do pagamento de IPTU”.
O especialista em direito imobiliário e ambiental ainda explica que mesmo pagando o IPTU, os moradores “ Essa é uma situação bem delicada, porque a pessoa que paga o IPTU ela acha que já é proprietária, afinal o IPTU é o Imposto de Propriedade Territorial Urbana. Então, ela acha que é o IPTU, mas não basta. Ela tem que ter um documento, nós chamamos matrícula do imóvel. Nessa matrícula sim, a certidão de propriedade. Mas com a emissão do IPTU, essas pessoas carentes elas acham que são proprietárias e a situação delas fundiária está regularizada, mas não. A prefeitura, então, ela já tem o carnê de IPTU emitido, ela já tem mapeado essas famílias que estão em situação de risco ou em situação desregularizada. Deveria, por meio da Secretaria de Habitação, regularizar essas propriedades que hoje tem programas específicos que facilitaram a regularização fundiária. Tanto é que nesses anos a Prefeitura de Mogi vem sim entregando vários títulos por meio da edição de nova lei que permitiu a regularização fundiária”.
Isenção de IPTU na região
A produção do Diário TV fez um levantamento nas cidades da região sobre possíveis isenções do IPTU. As prefeituras de Guararema e Santa Isabel disseram que não contam com este sistema de isenção.
Já a administração municipal de Suzano disse que o benefício é previsto há quase quatro anos, por meio de lei municipal, e é concedido aos proprietários de imóveis atingidos por enchentes e alagamentos.
As solicitações devem ser feitas no Centro Unificado de Serviços, o Centrus, de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. Após análise, os relatórios aprovados são encaminhados à Secretaria de Planejamento e Finanças para que a isenção do pagamento do imposto referente ao ano corrente seja autorizada.
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