Rafael dos Santos Silva foi assassinado após notícia falsa de que ele matou cães se espalhar pelo bairro. Sete suspeitos pelo crime foram presos e vereador é investigado pela Polícia Civil por propagação de notícia falsa e incitação ao crime. Rafael foi espancado até a morte após uma fake news ser divulgada
Arquivo Pessoal
Mãe de Rafael dos Santos Silva, Ariceli Santos espera por justiça no caso do filho que foi espancado até a morte em Suzano, na Grande SP, após uma falsa notícia de que ele matava cães. O caso revela como as fake news podem ser destrutivas e reacende o alerta sobre a necessidade de verificação das mensagens.
"Meu filho não merecia isso, ele não fez nada de errado e mataram meu filho. Todo dia eu fico pensando nisso. Isso não sai da minha mente, eu já estou ficando sem força. Meu filho morreu de graça, ele pediu tanto para não morrer e foi morto mesmo assim", lamenta a mãe.
O rapaz foi agredido com pauladas e pedradas em 17 de dezembro. A Polícia Civil já prendeu sete suspeitos do crime.
O delegado do Setor de Homicídio e Proteção a Pessoa, Rubens José Ângelo, informou ao g1 que o vereador Marcel da ONG (PTB) é investigado por propagação de notícia falsa e incitação ao crime.
No mesmo dia da morte de Rafael, o parlamentar publicou um vídeo, sem falar o nome do jovem, afirmando que a pessoa a quem os moradores atribuíam as mortes dos animais tinha vários vídeos em rede social dizendo que cachorro é "coisa do demônio". Ele chegou a citar que o suspeito confessou as mortes.
? Clique para seguir o canal do g1 Mogi das Cruzes e Suzano no WhatsApp
O delegado disse que nunca encontrou os cachorros que supostamente foram mortos e que a investigação não comprovou que Rafael matou cães.
"Não deu nada para o vereador e ele foi o culpado, porque fez a publicação dizendo que meu filho confessou e ele nunca confessou. Esse vereador precisa pagar por isso e eu só quero justiça, não quero nada mais do que isso", afirma Ariceli Santos que mora no Recife.
Por nota, a advogada do vereador, Graziella Salti Santana Bonini, informou que o parlamentar prestou esclarecimento no SHPP em 16 de fevereiro. "Ocasião em que forneceu todas as informações relevantes para a investigação do caso." (veja nota completa abaixo)
Rafael saiu do Recife para trabalhar em um sítio em Suzano e foi nesse emprego que permaneceu até os últimos dias em que viveu na cidade que fica na Grande São Paulo.
"Ele tinha apenas 22 anos, mas trabalhava muito, era muito esforçado e talentoso. Nunca tivemos problemas com ele, tínhamos um bom relacionamento. Meu marido pagou a passagem para ele vir para Suzano, e ele morava com a gente. Eu tenho certeza que só fizeram isso com ele, porque tínhamos viajado no final de semana. Jamais teríamos deixado isso acontecer", afirma Dóris Simãozinho proprietária do imóvel.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) informou que o Setor de Homicídios e Proteção à Pessoa (SHPP) da Delegacia Seccional de Mogi das Cruzes investiga o caso por meio de inquérito policial. A pasta disse ainda que um homem prestou esclarecimentos à autoridade policial, contudo, até o momento, não há comprovação do seu envolvimento no crime.
"No total, sete homens suspeitos pelas agressões foram presos após a morte de um jovem de 23 anos, ocorrida em 17 de dezembro de 2023, em Suzano, por espancamento. Na ocasião do crime, foi dito que a vítima teria agredido e matado dois cachorros, o que não foi comprovado", diz a SSP em nota.
A advogada da mãe de Rafael, Nayara Raíssa informa que todas as medidas necessárias serão tomadas, buscando que todos os responsáveis diretos ou indiretos pela morte do jovem sejam devidamente julgados e processados na forma da lei.
A defesa informa também que foi já foi protocolada uma apuração de quebra de decoro parlamentar na Câmara de Suzano, de acordo com a Resolução n°013-99/00, para averiguação sob a conduta do vereador que também propagou a fake news que resultou na morte da vítima.
Outro ponto reforçado pela defesa é o fato de que o vereador Marcel da ONG nunca entrou em contato com a família ou a advogada para prestar esclarecimentos ou solidariedade.
"Neste momento de dor, solidarizamos com a família e amigos, e buscaremos incessantemente para que a justiça seja feita!"
Como fake news sobre morte de cachorros causou o linchamento de um jovem e a prisão de 7 pessoas; veja o que se sabe
EditorialAutomáticoSELECIONAR IMAGEMTítuloMulticontent *Insira o título do multicontent a ser anexado
A importância da checagem
O professor de Gestão de Políticas Públicas na USP, Pablo Ortellado, ressalta a importância da verificação e de procurar por notícias confiáveis antes de compartilhar.
"Casos como este despertam a indignação, que é o sentimento que mais move compartilhamentos na internet. A recomendação que damos é para verificar antes de compartilhar, mas é muito difícil, porque as pessoas já estão indignadas. Elas não verificam e replicam esses boatos que resultam em uma tragédia."
Para Ortellado, o fato de o vereador participar de uma ONG de defesa dos animais pode ter acelerado a multiplicação da notícia falsa, já que ele faz publicações para um público que já tem grande sensibilidade com o tema. Com isso, não há uma reflexão antes do compartilhamento.
"Ele está se comunicando com um público que já tem grande sensibilidade com esse tema. Quando se traz o fato indignante, os seguidores que já apoiam a causa dos animais não param para refletir, para conferir, por exemplo, se algum jornalista verificou aquela informação", completa o especialista.
Poder da influência
Especialista em Direito Criminal, o advogado Jonathas Palmeira reforça que a criação ou disseminação de notícias falsas pode resultar em crimes, ainda que a conduta seja apenas a de compartilhar o conteúdo.
"Informações falsas podem violar a honra, incitar a prática de crimes, dar causa à instauração indevida de investigação criminal ou administrativa e, a depender do caso concreto, em situações mais extremas, induzir ou instigar o suicídio", alerta.
O advogado lembra ainda que o alcance da publicação feita por uma pessoa pública, com grande número de seguidores, é muito maior e, certamente, será considerado quando se fala nas consequências do crime.
Então, considerando que a liberdade de expressão não é um direito absoluto, ele orienta que, antes de compartilhar qualquer conteúdo recebido por meio das redes sociais, sejam adotados os seguintes cuidados:
Evitar o compartilhamento de mensagens ofensivas;
Pesquisar antes sobre as informações em sites jornalísticos, dando preferência para as notícias que estão nesses portais;
Conferir o contexto e a data;
Ter atenção redobrada para mensagens compartilhadas em grupos, principalmente originárias de listas de transmissão e aquelas identificadas como "encaminhadas com frequência";
Desconfiar sempre de contatos ou perfis desconhecidos.
Vídeo
Em um vídeo publicado nas redes sociais, o vereador aparece em um bairro de Suzano e conta que recebeu a denúncia que três cachorros foram esfaqueados. Em seguida, ele apresenta um morador do bairro e diz que o animal dele foi o último a ser atacado.
O homem diz então que o cachorro foi encontrado durante a madrugada esfaqueado, e que foi atrás de quem teria atacado o animal, que disse apenas que cachorro era coisa do demônio.
LEIA TAMBÉM:
Como fake news sobre morte de cachorros causou o linchamento de um jovem e a prisão de 7 pessoas; veja o que se sabe
Vereador é investigado em caso de jovem espancado até a morte na Grande SP após fake news
Suspeitos de espancar até a morte homem vítima de fake news são presos na Grande SP
'Filho amado e funcionário competente': quem era o homem que foi espancado até a morte por causa de fake news
Polícia prende último suspeito de espancar vítima de fake news até a morte na Grande SP
O vereador diz, no vídeo, que a pessoa que está sendo acusada pelas mortes dos cães pela população tem vários vídeos em rede social dizendo que cachorro é coisa do demônio. "A gente foi atrás dele onde ele tá trabalhando, acionamos a GCM que está a caminho e ele já confessou que matou e que é coisa do demônio, animal é coisa do demônio. Se ele tem algum problema mental, se ele é usuário de droga, ele precisa ser encaminhado para delegacia, familiar tem que ser comunicado, deve ser tirado de circulação ou fazer algum tratamento", afirmou o vereador no vídeo.
Por nota, a advogada do vereador, Graziella Salti Santana Bonini, informou que ele prestou esclarecimento no SHPP em 16 de fevereiro e ''que forneceu todas as informações relevantes para a investigação do caso".
Vereador é investigado em caso de morte de rapaz por fake news
Reprodução/ Redes Sociais
A defesa destaca que Marcel da ONG permanece à disposição para contribuir para a elucidação dos fatos e "que não há qualquer vínculo, de qualquer natureza, com o falecimento de Rafael."
"O Vereador Marcel da ONG, por meio de sua assessoria jurídica, lamenta profundamente o ocorrido com Rafael dos Santos Silva, e expõe sua total indignação e repúdio ao ato de crueldade contra ele praticado. Sobretudo, se solidariza com seus familiares e amigos", diz a nota.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) disse que, no total, sete homens suspeitos pelas agressões foram presos após a morte do jovem por espancamento. Na ocasião do crime, "foi dito que a vítima teria agredido e matado dois cachorros, o que não foi comprovado", diz a SSP em nota.
Entenda o caso
A agressão contra Rafael aconteceu no dia 17 de dezembro do ano passado, na Estrada do Tanaka, no bairro Estância Americana. Um boato de que ele teria matado dois cachorros a facadas foi espalhado pelo bairro e também na internet.
O delegado do SHPP, Rubens José Ângelo, disse que durante as investigações a notícia falsa não foi confirmada. Também de acordo com o delegado, os cachorros que as pessoas dizem terem sido mortos nunca foram encontrados.
Por conta da falsa notícia, sete homens espancaram Rafael até a morte. Seis deles foram presos no dia 30 de janeiro e o último no dia 6 de fevereiro.
"Rafael foi morto, foi espancado. Ele foi vítima de uma fake news. Uma notícia falsa. Uma vez que era divulgado pelas redes sociais, inclusive lives, de que ele teria matado dois cachorros. Fato esse que não se concretizou, não se confirmou. Sendo que populares, diversas pessoas o agrediram brutalmente", explicou o delegado.
Leia na íntegra a nota do vereador:
"O Vereador Marcel da ONG, por meio de sua assessoria jurídica, lamenta profundamente o ocorrido com Rafael dos Santos Silva, e expõe sua total indignação e repúdio ao ato de crueldade contra ele praticado. Sobretudo, se solidariza com seus familiares e amigos. Noticia, ainda, que não há qualquer vínculo, de qualquer natureza, com o falecimento de Rafael.
Desta forma, sem hesitação, Marcel prestou esclarecimentos ao SHPP de Mogi das Cruzes/SP na última sexta feira (16), ocasião em que forneceu todas as informações relevantes para a investigação do caso.
Nesta oportunidade, parabeniza o trabalho célere realizado pela equipe de investigação do SHPP, liderada pelo Delegado Dr. Rubens Ângelo, e permanece à disposição para contribuir para a elucidação dos fatos.
Comunica, por fim, que não compactua com fake news ou outras ações que possam denegrir a imagem de pessoas".
Rafael foi acusado de ter matado cachorros a facadas, o que nunca foi comprovado
Arquivo Pessoal
Assista a mais notícias