O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, informou a decisão do grupo em coletiva à imprensa nesta quinta-feira (29). Leia a carta divulgada pelo grupo na íntegra. Fernando Haddad, ministro da Fazenda, discursa na abertura do segundo dia de trabalhos do G20, em São Paulo
Diogo Zacarias/MF
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta quinta-feira (29) que as reuniões entre ministros de finanças e presidentes de bancos centrais do G20 acabaram sem consenso para um comunicado oficial do grupo.
Segundo Haddad, houve um impasse entre os países a respeito dos conflitos geopolíticos que estão em curso no Oriente Médio e no Leste Europeu. O ministro não detalhou quais foram os impasses.
"Nós havíamos nutrido a esperança de que temas mais sensíveis e relativos à geopolítica fossem debatidos exclusivamente nas trilhas diplomáticas. [...] Mas como não se chegou, na semana passada, uma redação em comum, isso acabou contaminando o estabelecimento de um consenso da nossa [reunião]", disse Haddad.
O ministro ainda afirmou que, apesar da falta de consenso sobre temas geopolíticos, as propostas sugeridas pelo Brasil foram bem aceitas pelo grupo. Ele destacou que o debate sobre a cooperação tributária internacional tem "avançado muito".
"Ninguém se manifestou contrariamente à proposta [feita pelo Brasil de tributação de riquezas]. O que houve foi uma parte [dos países] querendo focar exclusivamente na discussão sobre os pilares um e dois [da OCDE] antes de abrir uma nova perspectiva de debate", disse.
Os pilares mencionados pelo ministro são parte de agenda de cooperação tributária internacional que já está em discussão na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).
O acordo da organização, denominado Imposto Mínimo Global prevê dois pilares. O primeiro é voltado para distribuir os direitos de tributação internacional entre os países, enquanto o segundo estabelece o recolhimento de pelo menos 15% do imposto sobre a renda de grupos multinacionais que possuam um volume de negócios global anual superior a 750 milhões de euros.
"Nós esperamos que até o final do ano as discussões sobre os pilares um e dois tenham sido concluídas", afirmou.
Por fim, Haddad reiterou que ainda não há nenhuma orientação sobre quais devem ser os moldes de uma possível nova tributação sobre bilionários, e que ainda não há perspectiva de prazo para implementação.
"No contexto internacional, isso funciona muito lentamente. Você exerce a legitimidade do que você tem ao presidir e o tema ganha tração mais ou menos em função do interesse do grupo. Não dá para prever agora", explicou o ministro, destacando que, nesse caso, as discussões ligadas ao combate da desigualdade foram mais bem recebidas pelos países do G20.
"Obviamente o tema da desigualdade foi mais bem recebido porque há mais consenso de que é um problema grave e que tem que ser enfrentando globalmente. [...] Mas o Brasil fez desse tema [da justiça tributária internacional] um tema importante e traremos novas contribuições de pessoas especializadas", completou o ministro.
Veja na íntegra o resumo da Trilha de Finanças do G20, enviado pelo grupo:
Resumo da Presidência - 1ª Reunião de Ministros das Finanças e Governadores de Bancos Centrais do G20 São Paulo, Brasil 28 a 29 de fevereiro de 2024
Nós, Ministros das Finanças e Governadores de Bancos Centrais dos membros do G20, nos reunimos em 28 e 29 de fevereiro em São Paulo, Brasil.
Levando em consideração as três prioridades principais propostas pela Presidência Brasileira ao G20 em 2024, a saber: (i) inclusão social e o combate à fome e à pobreza; (ii) transições energéticas e desenvolvimento sustentável; e (iii) a reforma das instituições de governança global, trocamos opiniões sobre os desenvolvimentos econômicos globais e observamos que a recuperação econômica tem se mostrado mais resiliente do que o esperado, mas as perspectivas de crescimento no médio prazo permanecem contidas.
Circunstâncias desafiadoras exacerbam pressões socioeconômicas e ambientais de longa data ao redor do mundo, impactando desproporcionalmente populações pobres e vulneráveis, principalmente em Economias Emergentes e em Desenvolvimento (EMDEs). Portanto, enfatizamos a importância crítica da cooperação econômica internacional aprimorada para enfrentar desafios globais e promover uma economia mundial aberta e próspera.
Reiteramos nosso compromisso de promover um crescimento forte, sustentável, equilibrado e inclusivo, e de acelerar o progresso em direção ao alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), de acordo com o mandato ambicioso da Declaração dos Líderes de Nova Deli do G20 de 2023.
Para isso, em 2024, nos concentraremos em:
tornar a desigualdade um ponto central de preocupação política;
melhorar a representação e a voz dos países em desenvolvimento na tomada de decisões em instituições econômicas e financeiras globais a fim de oferecer instituições mais eficazes, credíveis, responsáveis e legítimas;
trabalhar por Bancos Multilaterais de Desenvolvimento (BMDs) melhores, maiores e mais eficazes, construindo sobre o legado das Presidências Italiana, Indiana e Indonésia do G20;
finalizar a solução em dois pilares, incluindo chegar a um acordo oportuno sobre a Convenção Multilateral do Pilar 1 até o final de junho de 2024 e continuar a promover o diálogo global sobre tributação justa e progressiva;
promover fluxos sustentados de recursos concessivos escassos para países de baixa e média renda necessitados, com estruturas de alocação claras;
abordar vulnerabilidades da dívida global de maneira eficaz, abrangente e sistemática, incluindo intensificar a implementação do Quadro Comum de forma oportuna, ordenada, previsível e coordenada, e aumentar a transparência da dívida;
promover a inclusão financeira e discutir o bem-estar financeiro;
fortalecer a prevenção, preparação e resposta a pandemias;
aumentar a mobilização de receitas domésticas e de capital privado;
e discutir mecanismos apropriados de compartilhamento de riscos entre capital público e privado para apoiar investimentos em infraestrutura e transições justas junto com as dimensões social, econômica e ambiental do desenvolvimento sustentável.
A economia global continua a enfrentar múltiplos desafios que se reforçam mutuamente e cujas soluções exigem uma cooperação multilateral renovada. Entre esses desafios estão:
conflitos em muitas regiões do mundo;
tensões geoeconômicas;
desigualdades persistentes, pobreza, desnutrição e doenças, que afetam de forma desproporcional grupos vulneráveis, especialmente crianças;
empregos informais, de baixa produtividade e baixos salários, especialmente em países em desenvolvimento;
vulnerabilidades elevadas da dívida e fluxos de capital de longo prazo contidos para EMDEs;
condições de financiamento mais restritas;
perda em larga escala da biodiversidade;
e desafios impostos pelas mudanças climáticas.
Discutimos uma ampla gama de tópicos para ampliar o financiamento para o desenvolvimento sustentável em meio a restrições fiscais urgentes, incluindo assistência ao desenvolvimento, mobilização de recursos domésticos, cooperação técnica e mobilização de capital privado.
Aguardamos com expectativa a discussão das propostas da Presidência Brasileira do G20 para buscar soluções urgentes para alguns desses desafios prementes, intensificando a cooperação por meio da Força-Tarefa para o Estabelecimento de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza e da Força-Tarefa para uma Mobilização Global contra as Mudanças Climáticas, em coordenação com o trabalho de outras iniciativas do G20.
Observamos que a probabilidade de um pouso suave na economia global aumentou, com o crescimento mostrando resiliência, apesar das divergências entre países e regiões. No entanto, a incerteza permanece alta.
Prevê-se que o crescimento global se estabilize em 2024 e nos próximos anos em um nível contido, aumentando o desafio de alcançar os ODS. A dinâmica do mercado de trabalho tem sido desigual entre as economias. Ao mesmo tempo, a inflação recuou na maioria das economias, em grande parte devido a políticas monetárias apropriadas, ao alívio dos gargalos na cadeia de abastecimento e à moderação dos preços das commodities.
Garantir que a inflação converge para a meta continua a ser um foco chave para os bancos centrais em linha com seus respectivos mandatos. Apoiar o crescimento, ao mesmo tempo em que fortalece a sustentabilidade fiscal e constrói reservas, permanece um desafio para muitos países.