Ministro comentou congelamento de R$ 2,9 bilhões, anunciado por Fazenda e Planejamento nesta sexta-feira. Haddad voltou a pedir cooperação entre os poderes para melhora das contas públicas e para a saída de 'um quadro caótico' deixado pela gestão anterior. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comentou o bloqueio de R$ 2,9 bilhões no orçamento deste ano, anunciado nesta sexta-feira (22) pela pasta e pelo ministério do Planejamento e Orçamento. Para ele, os resultados estão próximos do esperado pelo governo federal, e que a Receita Federal avalia periodicamente os resultados de arrecadação para ajudar a tomada de decisão.
"A cada bimestre, a Receita Federal vai fazendo uma avaliação das receitas que podem entrar ao longo do ano, os riscos de frustração e avaliações dessa natureza, como foi o caso da receita de concessões, que foi revista para baixo. E vai reavaliando as outras receitas, as receitas ordinárias, que, no nosso entendimento, poderiam estar subestimadas".
"Minha impressão e a impressão da equipe por ocasião do envio do Orçamento era que de que talvez as receitas correntes estivessem um pouco subestimadas, e as receitas extraordinárias um pouco superestimadas. Isso está se comprovando, mas elas estão se compensando razoavelmente bem", disse Haddad.
O ministro afirmou que foi um bom primeiro bimestre, mas que continuarão reavaliando as condições. A arrecadação do governo federal com impostos, contribuições e demais receitas somou R$ 186,5 bilhões em fevereiro deste ano, melhor resultado em 30 anos. Em janeiro, chegou a R$ 280,36 bilhões — também um recorde.
Nos dois primeiros meses deste ano, ainda segundo dados oficiais, a arrecadação federal somou R$ 467,2 bilhões, o que representa um crescimento real (acima da inflação) de 8,8% em relação ao mesmo período do ano passado -- quando somou R$ 431,4 bilhões (valor corrigido).
Segundo o ministro, indicadores econômicos melhores que o esperado têm ajudado a arrecadação. Questionado se é possível manter a meta de déficit zero, disse que o resultado depende da continuidade de um crescimento econômico acima das expectativas e da geração de vagas no mercado de trabalho formal, além de uma possível aprovação de medidas arrecadatórias enviadas pela pasta ao Congresso.
"Quando você tem uma regra de gasto primário [arcabouço fiscal], quando se tem um gasto acima do previsto em alguma rubrica, precisa fazer um ajuste. Se uma despesa vai aumentar para além do projetado, é preciso remanejar de algum lugar", afirmou o ministro.
Haddad reafirmou que o remanejamento das contas públicas depende de uma articulação do Executivo, Legislativo e Judiciário, para que não haja "surpresas". "Estamos aguardando a aprovação das medidas e a evolução das contas, ainda mais tendo saído de um quadro caótico", disse.
"Só em calote de precatórios foram 90 e poucos bilhões [de reais] no ano passado. Não é fácil explicar para as pessoas que tivemos que pagar quase R$ 100 bilhões de um calote dado por um governo anterior."
"Toda essa confusão que se refletiu na política, na tentativa de um golpe, e está sendo enfrentado agora, pela área política e econômica, para normalizar as condições no país. Da bagunça que estava em 2022 para hoje, houve uma evolução bastante consistente", afirmou o ministro.
Essa reportagem está em atualização.
Bloqueio no Orçamento
A informação do bloqueio consta no relatório de avaliação de receitas e despesas primárias do primeiro bimestre. A limitação será feita nos gastos livres dos ministérios, ou seja, aqueles que não são obrigatórios. Essas despesas envolvem investimentos e custeio da máquina pública.
Entre os gastos de custeio, estão: serviços de apoio, tecnologia da informação, energia elétrica e água, locação de bens móveis, diárias e passagens e serviços de comunicações.
O detalhamento de quais ministérios serão atingidos pelo bloqueio será divulgado até o fim deste mês.
O bloqueio acontece por conta do limite de gastos do arcabouço fiscal, a nova regra para as contas públicas aprovada no ano passado. Pela norma:
o governo também não pode ampliar as despesas acima de 70% do crescimento projetado pela arrecadação.
e o crescimento dos gastos não pode superar 2,5% ao ano em termos reais, ou seja, acima da inflação do ano anterior.
O objetivo do arcabouço fiscal é evitar, no futuro, uma disparada da dívida pública e uma piora nos juros cobrados dos investidores na emissão de títulos públicos.
Para calcular a necessidade de bloqueio no orçamento, o governo fez uma nova estimativa das receitas e despesas que serão feitas até o fim deste ano.
Entenda como funciona o arcabouço fiscal
Meta de déficit zero
O governo também busca zerar o rombo das contas públicas neste ano, meta que consta na Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) -- aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em 2023, o governo federal registrou um déficit primário (sem contar as despesas com juros) de R$ 230,5 bilhões. Foi o segundo pior resultado da série histórica.
O objetivo de zerar o rombo fiscal neste ano é considerado ousado pelo mercado financeiro, que projeta um déficit em torno de R$ 80 bilhões para 2024.
De acordo com o relatório de avaliação de receitas e despesas, entretanto, as contas do governo deverão registrar um déficit de R$ 9,3 bilhões neste ano.
Pelas regras do arcabouço fiscal, há uma banda de 0,25 ponto percentual do PIB para cima e para baixo da meta fiscal.
Com isso, o governo pode registrar um rombo de até R$ 28,8 bilhões em 2024 sem que o objetivo seja descumprido.
Em busca da meta fiscal, o governo aprovou, no ano passado, uma série de medidas para aumentar a arrecadação federal. O objetivo é elevar a arrecadação em R$ 168,5 bilhões em 2024.
As medidas são:
Volta da regra que favorece o governo em casos de empate no Carf, órgão colegiado responsável pelo julgamento de recursos de empresas multadas pela Receita Federal – com arrecadação esperada de R$ 54,7 bilhões em 2024.
MP que altera de tributação de incentivos (subvenções) concedidos por estados sobre o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – com receita esperada de R$ 35 bilhões neste ano.
Mudanças no regime dos juros sobre capital próprio, que consiste em uma forma de distribuição dos lucros de uma empresa de capital aberto (que tem ações na bolsa) aos seus acionistas;
Tributação de "offshores" e dos dos chamados fundos exclusivos;
Taxação do mercado de apostas eletrônicas em jogos esportivos.
De acordo com cálculo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, entretanto, as medidas de aumento de arrecadação renderão cerca de metade do esperado pela equipe econômica.
Histórico
O bloqueio de R$ 2,9 bilhões anunciado pela área econômica é maior do que o registrado em março do ano passado – no primeiro relatório de receitas e despesas do orçamento.
Naquele momento, não foi anunciado bloqueio de despesas. Ainda vigorava, no começo do ano passado, o teto de gastos – pelo qual as despesas não podiam crescer acima da inflação do ano anterior.
O teto de gastos teve início em 2017. Antes disso, os bloqueios no orçamento obedeciam à lógica das metas de superávit primário – propostas pelos governos e aprovadas pelo Congresso Nacional.
Para atingi-las, os governos tinham de bloquear gastos – com base nas previsões feitas no começo de cada ano para as receitas e para as despesas.
Em 2020, no início da pandemia da Covid-19, a equipe econômica chefiada pelo ministro Paulo Guedes indicou a necessidade, em relatório oficial do orçamento, de bloquear R$ 37,5 bilhões.
Entretanto, com o decreto de calamidade pública, aprovado logo depois, o valor não chegou a ser limitado. E novos gastos extraordinários, acima de R$ 700 bilhões, foram feitos.