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'As pessoas não se esforçam para entender, não dói nelas': mulheres com TAB relatam como é viver com a doença

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Neste sábado (30), é celebrado o Dia Mundial do Transtorno Afetivo Bipolar que ajuda a enfatizar o que a população que precisa viver com os sintomas da doença mais pede: respeito. O médico psiquiatra Luis Felipe de Oliveira Costa explica o que é o transtorno. TAB se caracteriza por oscilação do humor que pode ir da depressão a euforia

Divulgação

"As pessoas não dão atenção porque isso não afeta a vida delas. Elas só se afastam, te dão as costas e vivem a vida". Essa é a realidade da artesã Lizandra Rodrigues que mora em Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, e tem o diagnóstico de Transtorno Afetivo Bipolar (TAB).

Segundo a Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (Abrata), cerca de 140 milhões de pessoas no mundo têm o diagnóstico de TAB. Neste sábado (30), é celebrado o Dia Mundial do Transtorno Bipolar que ajuda a enfatizar o que a população que precisa viver com os sintomas da doença mais pede: respeito.

"Se fosse uma doença física, as pessoas estão enxergando aquilo que você tem, elas se interessam por aquilo, porque de alguma maneira está afetando elas. Quando é uma coisa mental, que está só dentro da gente, as pessoas não se esforçam para entender... Não dói nelas", relata a artesã.

O Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) é um quadro clínico que se caracteriza pela oscilação do humor, explica o médico psiquiatra e supervisor do Ambulatório Interconsultas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Luis Felipe de Oliveira Costa.

Segundo o especialista, as crises costumam durar em torno de dois a três meses em cada fase . O médico destaca que existem dois tipos de TAB: o tipo 1 quando o paciente apresenta crises maníacas com depressões muito graves e o tipo 2 quando existe alternância entre crises hipomaníacas – semelhante às crises maníacas, só que um pouco menos intensas – com depressões graves. (entenda mais abaixo).

Dificuldade no diagnóstico e preconceito

A artesã Lizandra Rodrigues tem 26 anos e conta que recebeu o diagnóstico há cerca de três anos. "Primeiro fui diagnosticada com depressão, mas eu sentia que tinha mais alguma coisa 'errada'. [Sentia] Que faltava uma peça, era algo que não passava. Eu via as pessoas com depressão que se tratavam, se curavam, e o meu não passava, parecia que quanto mais eu tentava melhorar, mais eu piorava", afirmou.

Artesã Lizandra Rodrigues tem 26 anos e recebeu o diagnóstico de TAB há cerca de três anos

Lizandra Rodrigues/Arquivo pessoal

Ela relata que, quando o diagnóstico veio, o alívio tomou conta. Um sentimento de, finalmente, achar uma solução. Depois de um tempo, além de ficar receosa sobre o tratamento da doença, ela sentiu medo do julgamento das pessoas.

"É uma doença que vou ter a vida inteira. Não tem cura. É aceitar que vou ter que tomar uma medicação todos os dias. É saber que eu tenho essa instabilidade, saber que as pessoas não podiam saber o que eu tenho, que eu era diferente no meio de muitas pessoas, o jeito que você enxerga o mundo, o jeito que você vive é diferente do 'normal' ao seu redor", diz.

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Com o tempo, Lizandra parou de tentar "esconder" o diagnóstico e decidiu que contaria para as pessoas ao redor dela sobre o transtorno. Nesse momento, mais uma surpresa: a rejeição.

"As pessoas não demonstram muito interesse, até desprezam, colocam como se não fosse algo relevante ou, simplesmente, passa batido. As pessoas não dão atenção porque isso não afeta a vida delas, isso não vai interferir no que elas querem", conta.

Para ela, o grande apoio foi o marido. Os dois estão juntos há nove anos e têm dois filhos, um de 6 anos e, outro, de 1 ano. Segundo ela, ele pesquisa sobre o TAB, a acompanha nas consultas e sempre faz questão de estar ciente do que está acontecendo.

"Ele é o meu apoio. Ele entende as dificuldades que outras pessoas não entenderiam. Eu tenho muita sensibilidade auditiva, tenho seletividade alimentar, não consigo ficar no meio de uma multidão, não consigo lidar muito bem com pessoas, tenho dificuldade de conversar, de manter relações… Além disso, tarefas simples do dia a dia, como pegar um ônibus para ir trabalhar ou até mesmo o ato de trabalhar, se relacionar diretamente com as pessoas, enfrentar uma fila de supermercado, ir a um show, são coisas que, muitas vezes, são difíceis", explica.

Resistência e hereditariedade

Quem também enfrenta a mesma situação é a dona de casa Adriana Rodrigues Mina de Souza, de 48 anos. A moradora de Mogi das Cruzes diz que recebeu o diagnóstico há sete anos e já perdeu muitos amigos por conta do transtorno, por não saberem como lidar com ela.

"Minha mãe também tinha o diagnóstico de Transtorno Afetivo Bipolar e eu sei como é, acompanhei de perto. Quando o médico disse que eu tinha, fiquei arrasada. Eu não queria ter também. Fiquei muito debilitada porque, quando eu descobri, já estava na alta crise da bipolaridade. Muito irritada, muito agitada. Então foi uma coisa muito frustrante na minha vida", diz.

Dona de casa Adriana Rodrigues Mina de Souza tem 48 anos e recebeu o diagnóstico há sete anos

Adriana Rodrigues Mina de Souza/Arquivo pessoal

Apesar da Adriana e da família dela já entenderem muito sobre o transtorno – por conta da mãe –, ela afirma que já passou por muitas situações constrangedoras por conta da falta de conhecimento da população sobre a doença. "As pessoas precisam saber respeitar, porque temos vários momentos: depressivos, de irritabilidade, de mania... E as pessoas têm que saber respeitar".

"Eu queria que as pessoas soubessem que eu não tenho culpa de ter o transtorno, nós não sabemos nem o motivo de termos isso, nós não escolhemos ter. Não temos como controlar. Nós nos sentimos muito isolados, muito afastados da sociedade… É como se fossemos um bicho-papão, que assustasse a sociedade", finaliza.

Diagnóstico e tratamento para o TAB

O médico psiquiatra Luis Felipe de Oliveira Costa atua como supervisor do Ambulatório Interconsultas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e também atende na ala de psiquiatria do Hospital Israelita Albert Einstein. Confira abaixo as explicações do psiquiatra sobre os pontos principais do TAB, o diagnóstico e os tratamentos do transtorno.

O que é Transtorno Afetivo Bipolar?

O Transtorno Afetivo Bipolar é um quadro clínico, uma doença, que ocorre no sistema nervoso central. Agora vamos decifrar o nome: "transtorno" é algo que gera no indivíduo uma disfuncionalidade, não é só estar um pouco diferente do normal, isso realmente causa prejuízos a essa pessoa; "afetivo" vem de afetividade, afeto é tudo aquilo que dá emoção na vida, então tem ligação com humor; "bipolar", como o próprio nome diz, quer dizer dois polos. Normalmente é um quadro clínico que se caracteriza por oscilação do humor, ou seja, uma hora a pessoa está de um jeito e outra hora ela está de outro.

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico é feito sempre pela história do paciente, pelas queixas que ele traz para o consultório, não há um exame específico para isso. Então é a soma daquilo que o paciente conta com o que eu também observo nele. Muitas vezes é necessário a presença da família, porque muitas das coisas que acontecem com o paciente, pode ser que ele não consiga observar, mas as pessoas que convivem com ele sim.

As crianças e idosos também podem ser diagnosticados com TAB. Entretanto, o transtorno costuma ser diagnosticado mais na fase adulta, entre 20 a 30 anos, que é quando costumam ocorrer as primeiras crises.

Quais são os tipos de TAB?

O Transtorno Bipolar tem dois tipos. No tipo 1 o paciente apresenta crises maníacas – crises de aceleração muito intensas – com depressões muito graves. Já no tipo 2, o paciente tem alternância entre crises hipomaníacas – semelhante às crises maníacas, só que um pouco menos intensas–, que alterna com depressões graves.

Quanto tempo dura uma crise?

As crises, na forma clássica, costumam durar em torno de dois a três meses em cada fase (maníaca/hipomaníaca e depressão).

Normalmente, também existe um período em que uma pessoa pode ficar sem ter crises. Esse é um dos grandes desafios dos médicos, porque o paciente muitas vezes acha que a doença foi embora, ele fica "bem". Isso é chamado de "eutimia", que quer dizer "humor verdadeiro", que é aquele humor que estamos acostumados a ter normalmente. Um estado de equilíbrio entre as duas fases.

Como é o tratamento?

O transtorno é uma doença de controle, não há cura. O tratamento é feito com medicamentos. Algumas pessoas são relutantes com a medicação, mas é necessária. A melhora não vem só com a psicoterapia.

Uma coisa interessante também é a "psicoeducação", ou seja, é o profissional da saúde ensinar a família e os amigos da pessoa com TAB sobre como são as crises, quais são os sinais de alerta que as pessoas devem saber e quando procurar ajuda.

"O que eu acho essencial que as pessoas entendam é o seguinte: quando procurar ajuda. Se você está diante de uma pessoa que você conhece e ela está muito diferente do 'normal' dela, está muito acelerada, tagarela, irritada, comprando coisas que não precisa e muito agressiva: essa pessoa precisa de ajuda, ela pode estar em uma fase maniforme (de mania). O contrário também, se ela está mais para baixo, deprimida, perdendo peso, apetite, perdeu vontade de fazer as coisas que ela fazia antigamente: está na hora de pedir ajuda. Esses são os sinais mais importantes para que a gente fique ligado no momento de procurar ajuda profissional", finaliza o psiquiatra.

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