Em entrevista, presidente da Argentina disse que sua equipe econômica trabalha em uma reforma do sistema financeiro, que possibilitará o fechamento da instituição. Milei afirmou não acreditar que a dolarização aconteça antes das eleições legislativas do meio de 2025. Javier Milei em março de 2024
Agustin Marcarian/Reuters
O presidente da Argentina Javier Milei disse que uma eventual dolarização só deve acontecer após fechamento do Banco Central do país. Para isso, segundo ele, sua equipe econômica está trabalhando em entregar várias reformas, em especial a reforma do sistema financeiro do país.
Na última semana, em discurso no Fórum Econômico Internacional das Américas, o presidente disse que quer integrar o formato dos bancos ao mercado de capitais, para que a Argentina possa migrar para um "sistema bancário livre".
"E, neste contexto, também mandatar a lei de não emissão monetária, onde consideramos que a senhoriagem é crime, é roubo, é falsificação, é fraude. Emitir dinheiro é uma farsa", disse o presidente.
Em entrevista à "CNN en Español", que foi ao ar neste domingo (31), Milei explicou que o objetivo por trás de reformar o sistema financeiro é, justamente, fechar o Banco Central do país — reafirmando uma de suas principais promessas de campanha.
O presidente considera que o BC é "um dos principais mecanismos pelos quais os políticos roubam os cidadãos, da forma mais grosseira e violenta" e destaca que "não adianta fazer várias reformas se o BC não for fechado".
Assim, a substituição da moeda oficial da Argentina, o peso, por uma moeda internacional, como o dólar, só seria possível após o ajuste dessas questões, segundo Milei.
Ele também comentou que não necessariamente o país será dolarizado neste processo, mas que é a própria população quem vai escolher qual moeda melhor atende as necessidades comerciais e sociais do país.
"A realidade é que não falamos estritamente sobre a dolarização. Sempre falamos sobre competição cambial. E, nesta competição cambial, se for imposta uma moeda, a moeda que vai ser imposta, devido às preferências dos argentinos, é muito provável que seja o dólar", disse.
Neste contexto, Milei afirmou não acreditar que a dolarização aconteça antes das eleições legislativas do meio de 2025.
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Primeiros meses de governo e parcerias comerciais
Quando perguntado sobre qual a maior conquista do seu governo nos 100 primeiros dias de gestão, Milei destacou ter "evitado a hiperinflação" da Argentina.
Em fevereiro, a inflação no país cresceu 13,2%, chegando a 276,2% no acumulado em 12 meses. Apesar da alta, o resultado mostrou uma desaceleração dos preços em relação a janeiro, quando a inflação subiu 20,6%.
O Banco Central da Argentina, um dia antes da divulgação da inflação do país, optou por reduzir a taxa básica de juros de 100% para 80% ao ano, citando que "desde 10 de dezembro de 2023, a situação econômica apresenta sinais visíveis de redução da incerteza macroeconômica", além de registrar uma "trajetória de queda da inflação no varejo".
Sobre o futuro, além dos planos com a reforma do sistema financeiro, fechamento do banco central e uma eventual dolarização, Milei também ressaltou o objetivo de manter alinhamento comercial com os Estados Unidos.
O presidente já declarou publicamente inúmeras vezes seu apoio e apreço pessoal ao ex-presidente americano Donald Trump, que é candidato à reeleição no país em 2024. No entanto, mesmo que o atual presidente Joe Biden ganhe a disputa pela Casa Branca, Milei disse que isso não será um problema e que manterá uma boa relação com o país.
"Independentemente de quem esteja no comando, e além das minhas preferências, que são públicas, minha prioridade é ser aliado dos Estados Unidos", comentou.
Perspectivas para a dolarização da Argentina
Em entrevista recente ao g1, o professor Paulo Feldmann, da FIA Business School, explica que a Argentina não tem recurso suficiente para conseguir promover a dolarização da economia — uma vez que é necessário substituir todo o dinheiro nacional em circulação pela moeda americana.
Então, como só os Estados Unidos podem emitir dólar, a Argentina depende que o Tesouro americano coloque mais moeda para circular. As reservas internacionais do país estão vazias e o próprio Milei disse, em seu discurso de posse, que não há dinheiro.
Assim, o primeiro desafio para a dolarização argentina hoje é, justamente, conseguir a quantidade de dólares suficiente para dar conta de toda a dinâmica econômica, além da necessidade que o presidente tem de provar que o país pode ser estável e confiável para atrair investimentos.
São tarefas difíceis, pensando que tornar um país realmente mais atrativo para receber investimentos é um trabalho de longo prazo, enquanto um mandado presidencial dura apenas quatro anos — e Milei já está na metade do primeiro ano.
Essa não seria a primeira vez, porém, que o país passaria por uma tentativa de dolarização. Na década de 1990, durante o governo de Carlos Menem, o então ministro da economia, Domingo Cavallo, desenhou um pacote de medidas para equilibrar a difícil situação da economia, e que determinou a paridade entre a moeda argentina e o dólar.
O Plano Cavallo, como ficou conhecido, visava a estabilização da economia, mas acabou em uma crise ainda maior do que o país já se encontrava, com uma taxa de desemprego de 18,3% e o indicador de pobreza em 34,32% no começo dos anos 200.
O principal problema, segundo Feldmann, é que, na época, ao mesmo tempo em que a Argentina aumentava sua dependência por dólar, o governo promoveu uma série de privatizações e a abertura econômica, o que tirou dinheiro do país e acabou com a paridade entre os preços do dólar e da moeda do país.
A tarefa de Milei, agora, é provar suas medidas econômicas a tempo, enquanto a Argentina continua passando por um período desafiador.